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sábado, 27 de março de 2010

E de repente...

Fecho os olhos. Inspiro profundamente e obrigo-me a esquecer do mundo que me rodeia. Concentro-me apenas no bater do meu coração.
Em meu redor, uma sala cheia, um burburinho imenso, conversas cruzadas, uma tosse e um espirro, talvez um bebé  a chorar.
Mas fecho os olhos e concentro-me.
Na minha cabeça, vou eliminando todos os sons. Penso na minha respiração, nos músculos que se contraem e se expandem cada vez que inspiro e expiro. Forço-me a visualizá-los.
Eis que já não oiço o bebé a chorar de fome e de sono.
Penso no meu coração, forço-me a olhar para ele enquanto trabalha mecanicamente.
Eis que já não oiço o senhor idoso a tossir nem aquela mulher grávida a espirrar.
Fecho os olhos e obrigo-me a encontrar aquele silêncio, a aniquilar aquela sala enorme, cheia de público.
Aos poucos, o negro silêncio vai cobrindo aquele espaço tão iluminado e tão barulhento.
Devagar. Eis que estou a chegar ao meu mundo. O burburinho ainda está lá, mas em mim vai-se esbatendo devagar e aos poucos.
Continuo a pensar na minha respiração. No meu coração. Obrigo-me a visualizar de antemão todos os movimentos que as minhas mãos vão fazer. Penso no que quero transmitir.
Inspiro lentamente e expiro lentamente. As conversas cruzadas já não me afectam.
Na minha mente, que atingiu o silêncio que eu tanto procurei, nascem novos sons. Nasce o que vou tocar.
Inspiro uma vez mais.
A sala está agora completamente muda, completamente calada.
Ao silêncio que nasceu ali, junta-se o apagar lento das luzes.
De repente, existo só eu.
Eu e o meu instrumento.
Tudo está calado, mudo, silencioso, expectante.
E de repente...
Como se já não fosse eu, mas sim alguém a guiar-me... 
O silêncio é deliberadamente rompido, alguém pega nas minhas mãos e fá-las tocar.
E um novo silêncio, diferente, nasce naquele espaço.
Um silêncio apenas marcado pela minha música.
Sim... estou em silêncio... interpreto... estou em silêncio e em paz comigo mesma.
E quando acabo e a ovação do público é estrondosa, continuo a nada ouvir.
Estou no meu mundo, estou ainda a gozar a música, apenas essa ecoa na minha cabeça.
Tudo o resto é um filme mudo.

Escrito para a Fábrica de Letras, para o desafio "Silêncio".

7 comentários:

  1. Gostei do teu texto.
    Pelo que tenho lido, tens muito jeito para escrever.
    Beijinhos e felicidades.

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  2. Soinita: obrigada =)

    Beijinhos e Feliz Páscoa.

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  3. Bem, muito bonito mesmo. Nem sei o que dizer, escreves lindamente, parece que tocas um instrumento musical e estudas música além de seres arqueóloga?? Bem, isso é que é. Continua, mesmo. Força nisto. Se quiseres e tiveres tempo dá um pulinho ao meu blogue tb. Qq crítica é bem vinda. Muito beijinhos e obrigado pelo acolhimento aqui no teu blogue.

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  4. Carlos: Muito obrigada! Ainda me fazes corar... Sim, escrevo, toco piano, falo francês, inglês, espanhol, loooool e ainda sou Arqueóloga... Bem, sou é doida por querer fazer tanta coisa. O próximo projecto é aprender violoncelo e aprender a dançar e arranjar tempo para yoga e dar aulas de piano. LOLOLOL.

    Não, agora a sério, obrigada pelas tuas críticas. Assim que tiver um tempinho (tipo esta noite ou assim) vou visitar o teu blog com muita atenção. Muito obrigada pela tua simpatia =)

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  5. Quem me dera ser mais diligente e exigente comigo mesmo, tal como tu o és, e fazer tantas coisas ao mesmo tempo. Beijinhos.

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  6. Carlos: ahahaha! A sério, o que faço não é assim tão fora do comum... Sou é doida, não é diligente lol!

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  7. Não vejo nada de loucura naquilo que fazes. Nada mesmo. Fazes o que gostas e geres o melhor que sabes o tempo para tudo isso. Isso é notável. Beijinhos e muita força.

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